segunda-feira, 26 de abril de 2010

fast life, slow food

Andei entrando numas de só estudar e trabalhar e fiquei com a impressão de que não tinha mais nada de interessante pra falar. Mas nada que um livro novo, uma noite divertida e a primavera que invade a cidade não pudessem resolver...
Depois dos momentos dramáticos no restaurante (ver post anterior), veio o fim de semana. Sabadão de sol, rumei pra Wilesden Green, no apê dos meus colegas portugueses: era dia de apresentar a feijoada brasileira pra gringaiada da escola. Nem panela havia na cozinha, e depois de gastar vários pounds em insumos, bateu um medinho de que não aparecesse ninguém pra rachar a conta e mandar ver. Fui pra cozinha e saí a preparar tudo, cantarolando a Feijoada Completa do Chico Buarque pra me certificar de que não me esquecia de nada. Aos poucos, a campainha começou a tocar, o povo começou a subir, e quando as panelas fumegantes saíram da cozinha, já tinha um batalhão de prontidão, embalado pela caipiroska e pelo tinto de verano providenciado pelos portugas. Tinha colega indiano, coreano, norueguesa, grego, americana, húngaro, sueco... e o nosso prato fez bonito, toda essa torre de babel comeu, repetiu e lambeu os beiços! A day party rendeu até capítulo especial pro reality show do meu colega coreano. Por falar nele, descobri que o Lee é um diretor super premiado. Ele dirigiu um documentário chamado Noodle Road, que mostra a cultura do macarrão no oriente. Só o preview já é emocionante, vou tentar assistir ao filme todo essa semana e posto mais comentários por aqui.
Durante a semana, no trabalho, o clima melhorou bastante. O Dean (cozinheiro do chilique) se emendou, foi gentil, paciente e até divertido na maior parte do tempo. Não sou de guardar rancor, fiquei amiga dele de novo e agora tá tudo em paz. Ele ainda me disse pra começar a fotografar os pratos e fazer anotações, coisa que eu pensava nem ser permitida dentro da cozinha. Mas é pra já, tava louca pra fotografar tudo, a partir de quinta-feira, cada pedido é um flash!
Depois de umas três semanas sem sair, quando a última sexta-feira chegou eu tava com o pé que era um leque! Saí na sexta com as gurias que moram comigo e até levantei os bracinhos quando tocaram Black Eyed Peas! A idéia era have fun, no matter what. No sábado, fui rever o Holland Park, depois de 15 anos, e digo que é muito mais bonito do que eu lembrava. Cheio de recantos, jardins floridos, tulipas de todas as cores... Nos gramados, piqueniques, ingleses freaks brincando de pegar (pessoal na faixa dos 40, mais ou menos), as crianças mais cuxicuxi do mundo - depois da Olívia, claro -, solzinho... life is beautiful, after all! À noite, fui jantar em Covent Garden com os meus colegas e depois fomos ao Favela Chic. Tava louca pra conhecer o lugar, um misto de favela brasileira e glamour francês, na sua Old Street branch. A decoração é bem a la Rocinha mesmo, as caipirinhas são ótimas, mas o DJ tava mais fora da casa do que seria de se esperar... Foi divertido, anyway, mas acabou cedo e nós tivemos que peregrinar atrás de uma festa que nos aceitasse. Unbelivable em uma cidade dessas, mas nada feito. Nossa noite acabou em um restaurante chinês em Picadilly, frequentado por cafetões e suas funcionárias, e a comida... bom, melhor deixar pra lá.
Como boa geek que eu sou (quando isso aconteceu???), no momento o que mais me empolga são minhas aulas e o livro que eu tô lendo. Conta a história do movimento slow food, contada pelo seu fundador, Carlo Petrini, em conversa com o jornalista Gigi Padovani. A forma como o movimento pretende salvaguardar aqueles alimentos ligados à cultura de pequenas comunidades, por vezes produtos ameaçados de extinção, tem tudo a ver com a proposta de um trabalho que eu desenvolvi no ano passado. (Caso alguém que não me conhece leia esse blog, explico: meu trabalho de conclusão na faculdade de direito defendia a extensão da proteção reforçada da OMC a todos os produtos dotados de indicação geográfica. Tomando como base o regime europeu de denominações de origem controlada, appelations d´origine e afins, quis mostrar que o mundo inteiro está repleto de produtos dignos de tal proteção. O Brasil, com a sua biodiversidade, é um exemplo claro.)Tenho muita vontade de daqui a um tempo voltar pro meu país e fazer uma incursão pela Amazônia, pelo Cerrado e pelos demais ecossistemas brasileiros, conhecer o que a nossa terra oferece... ler a respeito das origens do Slow Food reacendeu essa vontade! Quero entender até que ponto as comunidades são cientes do valor daquilo que produzem, saber de que tipo de proteção os conhecimentos tradicionais e as sementes nativas gozam no mercado nacional e internacional, e lógico, quero usar nossas iguarias na minha cozinha!
Engraçado, hoje mesmo um chef americano me adicionou no Facebook e nós tivemos uma discussão acalorada sobre esse tema... Até me exaltei, mas é um risco que se corre quando se trata de um assunto que apaixona. Felizmente, não houve mortos e feridos e o debate foi até bem produtivo!
Sem dúvida essa história ainda vai dar muito pano pra manga... Por enquanto, eu paro por aqui, já que a prosa é longa e a aula começa às 9h.
Beijocas saudosas!
P.S.: fiquei com preguiça de arrastar cada foto pro seu devido lugar, então elas estão aí abaixo, com as respectivas legendas:

Fingindo que medito no Kyoto Garden, Holland Park;
Eu e o Zé no preparo da feijoada (na hora da foto o povo se aprochega ao fogão...);


Intervalo com Weiss Bier e meu colega Nikolaos; 
Andando no meio das flores;
Contrastes do Holland Park;

Favelando...

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Entre livros e panelas

Quando minha amiga Nati comentou, ali embaixo, sobre a livraria para cozinheiros de Notting Hill, pensei comigo: como ainda não postei nada sobre isso? É verdade que eu já tinha dado de cara com a porta da Books for Cooks uma vez, quando no 1º dia de aula fui até lá, cheia de esperança... pra descobrir que eles não abrem às segundas-feiras! Mas não tem nada, não: voltei na quinta, e aí sim, me banqueteei.
A casinha na Blenheim Crescent é o equivalente culinário da livraria para viajantes que o Hugh Grant tinha naquele filme que se passava nesse mesmo lugar: diminuta, mas muito completa e charmosa. Como o Hugh não estava atrás do balcão, credito o charme aos títulos que eu encontrei ali pelas prateleiras e ao café que funciona nos fundos. Além de sessões específicas para cada tipo de carne, molhos, culinária dos mais diversos países, livros de chefs, dicionários gastronômicos e outros quetais, me chamaram a atenção os espaços dedicados à história da alimentação e à literatura gastronômica. Desnecessário dizer que eu sou bem afeita tanto à escrita, quanto à comida. Sendo assim, na frente daquela estante encontrei companhia pra todas as minhas viagens pelo tube, além de ocupação a perder de vista pra minha mesinha de cabeceira.
Minha primeira aquisição foi o Guide Culinaire, de Auguste Escoffier, traduzido para o inglês. É um livro de receitas clássicas? É, mas dada a importância do autor, a linguagem por ele utilizada, e a tarefa à qual ele se propôs (sistematizar a cozinha) é também uma obra deliciosa de se ler. Virou meu companheiro de estudos: a cada semana, repasso com ele as aulas da LCB. (Nesses momentos também uso bastante o On Food and Cooking, de Harold McGee, indispensável pra todo cozinheiro que quer saber porque um prato é assim, assado, frito e cozido.)
Trouxe pra casa também um livro sobre Slow Food, escrito pelo fundador do movimento, Carlo Petrini, que eu ainda nem tive tempo de tirar da sacola, mas logo mais eu comento por aqui. E por fim uma autobiografia da Ruth Reichl, editora da finada revista Gourmetcujo título é Tender at the Bone. Esse eu comecei a ler right away. Tinha muita curiosidade sobre a trajetória dessa mulher, já que penso muito em enveredar pela escrita gastronômica, e ela é um ícone na área.  
Já tô nas últimas páginas do livro, e hoje li um trecho especialmente significativo, em que a autora resolve finalmente ir trabalhar em um restaurante depois de anos cozinhando por prazer apenas. A descrição que ela faz de se estar na cozinha, 100% presente, sentindo cansaço físico agudo depois de uma jornada de trabalho, e ainda assim - talvez exatamente por todos esses motivos - ser uma experiência prazerosa, se encaixou com perfeição à maneira como eu enxergo esse ofício.
Ler isso hoje à tarde me fez um bem enorme, já que meu dia não vinha sendo fácil... No 1º dia em que me puseram a montar pratos, eu obviamente cometi alguns enganos e pude provar da ira de um dos cozinheiros. Confesso que com isso eles perceberam que às vezes, ter uma mulher na cozinha pode ser um pouco diferente. Até hoje, nunca tinha me importado com patadas, cortes, queimaduras (tirando aquelas queimaduras...), nunca tinha derramado uma lágrima em serviço. Até hoje. Mas também nunca tinha sido destratada no trabalho. Não dei chilique, não parei de trabalhar, mas as lágrimas começaram a escorrer, couldn´t help it! E aquela brigada tão concentrada, rápida e precisa se desestruturou, como fazem os homens sempre que vêem uma mulher chorar... O próprio chef logo parou o que tava fazendo pra vir conversar comigo, se desculpar pelo temperamento do sujeito e checar se eu realmente estava bem. O esquentadinho pediu desculpas e logo o serviço acabou. No vestiário, a Kasia, uma garçonete do restaurante vizinho, viu meus olhos vermelhos e veio me confortar, conversar um pouquinho comigo. Por último, ela me aconselhou: "don´t be such a nice person!". She was rather nice, though. Fosse latina, eu teria dado um abraço. Sendo russa, por via das dúvidas, dei um aperto de mão e um sorriso sincero.
Falei em diferenças entre homens e mulheres na cozinha porque pensei bastante sobre isso ao longo do resto do dia. E pode ser mesmo que um homem jamais chorasse em uma situação como essa. Mas tenho certeza de que meus colegas não consideram agradável, ou mesmo natural, receber um tratamento agressivo no ambiente de trabalho. Assim como os homens com quem eu trabalhei anteriormente sempre foram igualmente competentes e muitíssimo mais educados, tendo me recebido na cozinha do Hashi, em Porto Alegre, quando eu não tinha absolutamente nenhuma experiência. Na minha cozinha grosseria nunca vai ser rotina. E a partir de segunda, chega de ser boazinha. Agora o pastry chef rabugento vai conhecer a verdadeira Mariana!
Have a lovely weekend!

domingo, 11 de abril de 2010

Now we´re talking!

Domingo já se firmou como dia oficial de regar o blog. Em Londres, em Porto Alegre, na Bíblia, em qualquer canto, o 7º dia se presta ao descanso e à contemplação, com a recarga das baterias pra semana que começa. Sendo assim, cá estou eu, debaixo das cobertas, contemplando as fotos dos últimos dias, e com as energias devidamente abastecidas depois de um risotinho e uma overdose psicodélica de macarons de todas as cores.

Ontem, enquanto eu corria e viajava na maionese (atividades que eu gosto muito de desempenhar simultaneamente), pela primeira vez enxerguei minha situação atual em 3D. Explico: até há pouco, minha euforia diante de todas as descobertas e mudanças vinha me fazendo sentir um tanto "boba-alegre", alheia a qualquer ônus que a minha condição pudesse implicar. Mas uma solidão imensa me mostrou que ficar solta no mundo não é só alegria; que depois de 10 horas de trabalho, tudo o que eu quero é encontrar meu namorado em casa e contar pra ele como foi meu dia; que um parque lindo que eu descobri teria muito mais graça com um piquenique com meus bons e velhos amigos e que quando eu atravesso a cidade sozinha de madrugada, sinto é falta da minha mãe ligando, querendo saber onde eu tô e se tá tudo bem. Encarar tudo isso não me faz pensar em voltar atrás, de jeito nenhum. Eu diria até que enxergar as pedras do caminho ajuda a me apropriar ainda mais da experiência, concluindo que a parte boa vale - e muito! - a pena. Ainda assim, me identifiquei quando vi esse retrato da Amy fincando pé no seu tão amado cantinho no mundo. Se ninguém pode ficar entre ela e Camden, digo que nem a distância pode ficar entre mim e as pessoas que eu mais amo. A gente vai encontrando maneiras de se manter pertinho, não é mesmo?
Feitas as divagações (que tendem a dar pinta por aqui every now and again), admito que sei de onde essas idéias surgiram: comecei a trabalhar, e com isso adquiri uma rotina que vai ajudando a fincar minhas raízes nessa terra, pelo menos por um período. E agora em um emprego quase bom demais pra ser verdade: um restaurante de alta gastronomia, uma vaga de aprendiz, horários flexíveis, sem trabalho nos finais de semana E remunerado! Como diria minha housemate Amanda, "quer me agradar?"! Era tudo o que eu idealizava: ter a chance de aprender, sem maiores responsabilidades, sem comprometer meus estudos e trabalhando com um cardápio recheado de ingredientes e técnicas com as quais eu começo a me familiarizar.

O nome do restaurante é Sauterelle http://www.restaurantsauterelle.com/restaurantsauterelle.com/), e ele fica no Royal Bank Exchange, em uma região que concentra escritórios, bancos e afins. Não vou falar muito no cardápio e na decoração porque ainda não tive tempo de tirar fotos, e nesse caso, elas falariam por si. Mas é pra já, prometo! Por enquanto me limito a apresentar a fada madrinha que me arranjou essa baita oportunidade: a Mel, responsável por boa parte da cafeína que circula nas mentes pensantes dos poderosos de Londres. E com muita competência: o café dela é o melhor que eu já tomei por aqui até agora (e que a minha dermatologista não leia isso, mas eu tenho tomado litros de café). Pois entre os clientes da Mel está o Robin, chef do Sauterelle, e foi ela quem deu meu currículo pra ele. Além de ter mãos de fada-barista, ela é uma queridona e ainda me deu essa barbada de bandeja! Cá pra nós, todos os anjos da guarda que perderam o avião pra Austrália 4 anos atrás, dessa vez vieram em comitiva comigo pra Londres, e agora trabalham dobrado!



Um dos pontos altos da semana foi meu primeiro double shift, na sexta-feira. Trabalhei das 8h às 15h e depois das 17h às 23h. No intervalo, o sous chef me levou pra conhecer as redondezas, e eu finalmente conheci nosso vizinho mais interessante: o Borough Market. Quem me conhece sabe que me soltar em um mercado ou feira equivale a soltar criança em pracinha. Se tivesse chegado lá sozinha, já teria feito a festa; com um cozinheiro local como guia, então...





Nossa primeira parada foi o Neal´s Yard, um templo de devoção ao queijo. De todas as variedades ali expostas, eu devo ter provado uns 10%, e reparem que eu comi uns 18 pedaços de queijos diferentes. Nem almocei naquele dia, e só fui sentir fome na manhã seguinte. Eram queijos britânicos, e cada um deles ostentava uma plaquinha indicando o tipo, o nome do produtor e o local de origem. Cada funcionário conhecia profundamente o produto que vendia, e sabia descrever minuciosamente as características e propriedades de cada variedade. Eu só sabia dizer "very good" enfaticamente, vou ter que estudar um pouco antes de voltar lá pra não passar vergonha...


















Próxima parada: Monmouth Coffee Company. A essas alturas, o Dean, sous chef/guia já tinha sorrido umas 4 vezes e eu ia deixando de ter medo dele. Quando ele disse que aquele era o melhor café de Londres, contudo, não quis contrariar mencionando a Mel, e aceitei um espresso. Descobri o 2º melhor café da cidade. A Monmouth é uma companhia de torrefação que começou modesta, em um porão em Covent Garden, sempre com a idéia de descobrir grãos "interessantes" e apresentá-los aos clientes. Hoje eles compram grãos de pequenas fazendas e cooperativas ao redor do mundo - yes, havia café brasileiro no menu -, conhecendo cada produtor e os métodos empregados para obtenção dos respectivos cafés. Resultado: um cuidado e respeito para com a bebida que me faz maldizer cada vez que eu botei os pés nos onipresentes Starbucks pela vida afora.

Pós café, uma passada na L. Booth, fornecedora dos vegetais usados na cozinha do Sauterelle, onde eu encontrei uma abundância de cores e formas até então estranhas pra mim, tipos de cogumelos que eu nunca tinha imaginado e ruibarbo em estado natural, que eu nunca tinha visto. Nessa hora a bateria da câmera acabou e eu não pude documentar minha euforia diante dos frutos do mar, mas vou virar freguesa do Borough Market, sem dúvida. Não vejo a hora de ter double shift de novo pra passar todo o intervalo por lá, olhando, tocando, experimentando, fotografando...







Weekend, once again. Minha corrida reflexiva foi no Alexandra Park, nova descoberta aqui pertinho de casa. Na direção da zona 4, Londres volta a ser bonita e agradável, com ares de cidade pequena, e esse parque fica em um ponto alto de onde se tem uma vista linda! Os dias aqui começam a ser ensolarados, e à tarde no sol dá até pra usar bermuda e camiseta sem sofrer. No final do dia, a coisa muda bastante de figura. Aprendi isso ontem lá pelas 19h, quando minhas pernas ficaram roxas, trêmulas e arrepiadas a la frango depenado, e eu fui obrigada a voltar pra casa, depois de um piquenique em London Fields. Era despedida do meu primo Chico, que passou um mês aqui e até agora eu não tinha encontrado. Unfortunately, porque a tarde na companhia dele e de toda a turma foi muito gostosa, queria ter conhecido antes...!

E hoje, a cereja glamourosa do bolo semanal: café com praliné plaisir na Ladurée. Fui até a Harrod´s pra comprar facas, mas quando entrei naquele lugar e vi aquelas pirâmides de macarons esqueci as facas, as calorias e o mundo lá fora. Fiz minha caixinha com um macaron de cada cor e voltei pra casa saltitante, não sem antes balançar minha sacolinha pelo Hyde Park.
E assim foi. Com o despertador marcado pra daqui a 5 horas e meia, paro por aqui.
Boa noite e boa semana!

terça-feira, 6 de abril de 2010

Coisas que eu vou vendo por aí...

Não dá pra ver direito (sou cozinheira, não fotógrafa!), mas no listradinho (=de presidiário) tá escrito: "been inside for 9 months". Não é sensacional?
E o texto aí do lado tá na parede do metrô aqui da esquina. É uma pérola atrás da outra do célebre humor inglês, quando me deparei com ele cheguei a torcer pro trem atrasar, pra dar tempo de ler até o fim.
Ah, eu falei "o texto aí do lado"? Quis dizer justaposto. E os tip tops lá de cima são realmente visionários...


domingo, 4 de abril de 2010

A escola e a cidade

Paul Boulangerie: não é o Xirú Beer, mas já é alguma coisa...





Brick Lane e suas barraquinhas delícia...


Batizei este post com uma paródia besta do nome do seriado onde o sexo e a cidade são os principais protagonistas. Pois no meu caso, Londres e as recém iniciadas aulas norteiam todos os meus passos e pensamentos. Nos primeiros dias livres que eu tive por aqui, cheguei a ficar tonta com a quantidade de lugares a conhecer e coisas pra fazer, mas na medida em que os melhores momentos do dia foram os menos programados, relaxei e comecei a me deixar levar pela cidade. Pelo menos nos primeiros dias.
Lógico que no que diz respeito à escola, não é bem assim que funciona. Horários e códigos estritos de conduta são a nossa rotina, e na primeira semana isso já ficou bem claro. Começamos com um curso de 1 dia (sábado!) sobre higiene e segurança, com direito a prova no final. Na segunda-feira, iniciaram as aulas propriamente ditas. Funciona assim: 3h de demonstração, com um grupo de umas 30 pessoas em uma sala onde um chef prepara uma ou mais receitas. Nosso caderno contém somente os ingredientes necessários, e cabe a nós anotarmos o processo todo. Pra essa aula, é exigido o uso das calças e do casaco do uniforme, enquanto que nas práticas são obrigatórios também avental, sapato de segurança, chapéu, rede de cabelo, e panos.
Terminada a demonstração, com os pratos montados, o chef libera as fotos e degustações. Intervalo. A próxima aula será prática, também com duração de 3h, para execução das receitas ensinadas. Pras aulas práticas, ficamos separados em grupos de dez pessoas, e cada aluno recebe os insumos pra realizar sozinho todas as receitas. Até agora, considerei essa a principal diferença entre o curso que eu fiz no Brasil e a Cordon Bleu, já que no primeiro as aulas práticas eram ministradas ao grande grupo. A turma de 32 pessoas ficava em uma cozinha dividida em grupos de 5 ou 6 e cada um desses grupos deveria apresentar todas aquelas receitas ao final da aula. Assim era normal que entre 6 pessoas, aquela que cortava melhor cuidasse dos cortes, a doceira de mão cheia cuidasse das claras em neve, os guris - mais fortes - quebrassem os ossos e juntas dos bichos, e assim por diante. Ou seja: as deficiências de cada um tendiam a seguir presentes, sem oportunidade de serem corrigidas.
Pra introduzir os alunos ao padrão de excelência Cordon Bleu, nada melhor do que uma aula de cortes, onde 1mm faz TODA a diferença. Uma julienne perfeita nunca foi meu forte, mas em dois dias de aula aqui percebi uma evolução impressionante. Isso porque no final da aula, o chef analisa cada prato minuciosamente, e ninguém quer ouvir dois dias seguidos a mesma crítica, então o jeito é buscar a perfeição. E as exigências não se limitam à técnica ensinada na demonstração: o chef examina uniforme, barba dos homens, jóias, penduricalhos, redinha no cabelo, sapato apropriado, apresentação dos pratos, organização da estação de trabalho... todo e qualquer detalhe!
Julienne, Brunoise, Macédoine, Bouquet Garni, Cisellé, thinly chopped...

As aulas vão de segunda a quarta, seis horas por dia. Nos intervalos entre as demonstrações e as práticas, eu passeio pelas redondezas da escola, que fica em uma das regiões mais charmosas da cidade. A Marylebone High Street concentra um monte de cafés, pâtisséries e boulangeries deliciosos, além de ser walking distance de Mayfair, com suas vielas recheadas de restaurantes e lojas de babar. Fotos serão sempre postadas! Como a da Paul boulangerie, abrindo este texto, onde eu almocei um sandwich provençale na semana passada, com pimentões, coração de alcachofra e emmenthal, bommm...!
Já falei que meu itinerário aqui se baseia no universo gastronômico e na infinidade de opções interessantes que a cidade oferece. Tentando encontrar um método pra desbravar Londres, dei de cara com um sem número de livros, revistas e almanaques com os 100 programas imperdíveis na cidade, milhares de resenhas de restaurantes, uma verdadeira overdose de opções! Até que, enquanto esperava uma amiga em uma livraria de Notting Hill, me deparei com um livrinho miúdo, chamado London Gourmet. Nele encontrei dicas gastronômicas de insiders, lugares escondidos, mercados pela cidade, padarias, peixarias, açougues, delicatessens, lojas de vinhos e preciosidades afins. Um texto gostoso de ler, que dá vontade de conhecer cada lugarzinho no mesmo dia! Decidi que vai ser meu guia por aqui, vou conhecer tudo o que meu tempo e meu orçamento permitirem e dividir cada descoberta com vocês. A primeira foi o Paul, em seguida tem mais.
A Páscoa por aqui foi movimentada, com visitas às Tates - Britain e Modern, passeios por Notting Hill, Camdem Town e Brick Lane e uma noitada tipicamente londrina, at last!
De cima para baixo: entrada (convidativa, não?) de banheiro feminino em um café-balada vespertino da Brick Lane; teto (em todos os sentidos) da Tate Britain; obra de Miroslaw Balka na Tate Modern (um mergulho na escuridão); obra de arte contemporânea em exposição na Tate Britain e calçadinha em Camdem Town.
Não aguentava mais sair pelas bandas da Leicester Square, com suas hordas de turistas e músicas pasteurizadas que tocam em qualquer biboca desse mundão. Fomos pra Clapham Common, em um lugar chamado The Lost Society, e esticada na vizinha Artesian Well. Música muito boa, povo bonito se divertindo sem porraloquice, diversão decente. Nem chegou aquele momento que já vinha se tornando costumeiro, quando eu olho em volta e penso comigo: "o que mesmo eu tô fazendo aqui?" (normalmente isso acontece quando um bêbado vem conversar comigo e de cada duas frases que ele diz, uma é "you smell really good". Com a Beyoncé aos berros de trilha sonora. Deuzulivre...).
Em Brick Lane eu vi um festival de gente estilosa, pavilhões e mais pavilhões de feiras vintage, baladas diurnas com fila na porta, barraquinhas de comida de todos os cantos do planeta, mega liquidação da American Apparel, um burburinho maravilhoso. E pechinchas imperdíveis! Aliás, vou dedicar um post só aos achados dessa cidade, à quantidade de coisas lindas que se podem pagar com moedas!

Sintam o pessoal da barraquinha de comida japa, se não tivessem sorrido pra foto eu juraria que eram da Yakuza...
By the way, gente, me estendi, né? Vou parar por aqui porque já são 1 e meia da manhã e amanhã a idéia é acordar cedinho pra catar uma day trip partindo da estação de King´s Cross. Beijos e abraços impregnados da melancolia dominical: depois de tantas atividades, me bateu uma saudaaade de casa!